Quatro mestres do “trash talk” no poker

William Kassouf

Antes de 2016, o cidadão britânico Will Kassouf não era muito popular na comunidade de poker, até que conseguiu uma boa run no Main Event da WSOP 2016 enquanto deixava todos os jogadores de sua mesa – e até alguns dealers – doidos com sua tagarelice interminável, maneirismos e comportamento geral.

Para ser honesto, ele não era rude ou brutal, mas falava tanto que outros jogadores não viam a hora de alguém finalmente eliminá-lo, dando uma folga para todos.

Por exemplo, no dia 5, Will encheu tanto o saco do co-proprietário da Dealer Academy, Stacy Matruson, que o diretor do torneio foi convocado para pedi-lo para parar – no final das contas, Stacy acabou foldando uma mão melhor, graças a pressão do caráter de Kassouf.

Quando ele terminou o Main Event no 17º lugar, ganhando US$ 338.288 mil, os outros jogadores ficaram verdadeiramente aliviados que ninguém teria que jogar com ele na mesa final. 

Will aprendeu sua lição? Podemos dizer que sim, considerando que ele continuou usando o poder do seu discurso avassalador para pressionar, desorientar, incomodar e tiltar seus oponentes, ganhando um valor extra. Pelo menos, foi assim que ele explicou seus atos em uma entrevista: “A conversa na mesa é uma grande parte do meu jogo. Eu consigo muita informação sobre meus oponentes falando com eles, mais do que apenas coçando minha cabeça e botando fichas no pote. Com alguns jogadores, eu chego tão profundamente que eles até mesmo chamam o floor. Mas não faço nada errado, não quero regras, mesmo que as pessoas reclamem, especialmente os estadunidenses que não estão acostumados com brincadeiras e com jogo falado, mesmo durante um heads-up”, comentou.

Martin Kabrhel

Outro profissional em irritar com palavras é o empresário tcheco com uma cara expressiva e voz especial (que alguns jogadores até a descrevem como “passar as unhas na lousa”). O já lendário personagem do poker, Martin Kabrhel.

O que torna ele especial? Bem, ele usa seu tom de voz único e pronuncia específica para comentar quase tudo que quer durante o jogo, além de perguntar e repetir questões constantemente e com grande persistência, do modo mais irritante, até que alguém o pergunte.

Por exemplo, quando ele conseguiu uma vaga na final table do US$ 250K Super High Roller da WSOP 2025, após um fold de Ben Heat, Kabrhel disse para Jason Koon:

“Eu tinha um Ás de Copas, nut flush, nut flush – boa jogada, né, Jason? Eu jogo bem, né?”.

Koon o respondeu abruptamente e de maneira relutante, coisa que Martin apenas ignorou, continuando a falar.

Outro exemplo no mesmo torneio: ele caracterizou verbalmente um dos limps de Daniel Negreanu, dizendo:

“O que você tem, Reis? O que você tem, Áses? Eu acho que estamos vendo um dos maiores limps da história do poker. Pimpy-Limpy! Digite isso para Amanda, por favor”.

Para contexto, Amanda é a esposa de Negreanu, para quem ele não poderia mandar nenhuma mensagem naquele momento por conta das regras da WSOP a respeito de dispositivos eletrônicos em mesas finais.

Você ficará “Kabrhelizado” rapidamente se assistir o vídeo do US$ 250K Super High Roller da WSOP 2025, quando Martin conseguiu irritar quase todo o topo da comunidade do poker, incluindo Daniel Negreanu, Bryn Kenny, David Peters, Alex Foxen, Chris Brewer e Ben Tollerene.

Não importa quanto ódio você sinta pelo comportamento de Martin, ele sempre tenta se manter positivo e aborda seu status controverso com humor. Por exemplo, durante a WSOP 2025, Kabrhel tuitou que agora as pessoas querem tanto tirar fotos com ele que passou a cobrar US$ 1 milhão, com descontos:

• 90% se você não o fizer perder tempo
• mais 70% se não for fumante
• mais 50% se for esperto
• mais 40% se radiar energia positiva
• mais 20% se for um jogador de GTO

Aliás, o segredo do discurso troll de Martin é simples: ele não é um troll – ele é apenas diferentes, e sabe com usar isso no poker.

Nikhil “Nik Airball” Arcot

Regular em jogos emocionantes de high stakes, Nik Airball pode ser considerado o mais famoso trash talker dos cash game presenciais televisionados nos anos 2020s, sendo às vezes muito extremo na sua atitude.

O estilo de falar do Nik em jogos streamdos é – no mínimo – controverso, porque ele tem a habilidade de falar palavras bem duras na cara dos oponentes (e até para dealers às vezes).

Lembre-se dele falando “Vai se foder muito” para Pipi no programa da HCL, ou “Você é minha puta” para Dan “Jungleman” Cates nas streams do cash game The Lodge.

Curiosamente, Nik começou a construir sua imagem de bully antes de chegar as streamers. Foi em um jogo público que ele foi notado por scouts de cash games high stakes e convidado para jogos televisionados. Então, agir como uma baleia da boca grande que joga dinheiro a torto e a direito abriu as postas do jogador para streamers de cash games high-stakes por, pelo menos, três anos consecutivos sendo participante nos maiores cash games televisionados:

• Hustler Casino Live
• Poker at The Lodge
• High Stakes Poker
• Bally Live Poker
• No Gamble, No Future

Curiosamente, fora dos jogos Nik não parece ter a imagem de bully ou agressor. Durante o podcast de Dan Cast, em 2023, Airball foi bastante educado e explicou a escolha da sua imagem pública de maneira simples:

“Primeiros, estamos nas streams, temos que entreter. Eu não acho que qualquer pessoa quer sentar e ver a gente cobrindo a cara e grindando. Isso não entretém as pessoas. A segunda coisa é que o trash talk faz parte do meu jogo. Acho que isso me dá uma brecha porque eu entro na cabeça dessas pessoas e faço elas jogadores pior, conseguindo decifrar como eles jogam em diferentes spots e usando isso em minha vantagem. Eu acho que isso torna o poker um jogo competitivo, todo o trash talk e diversão.

Bônus: o brasileiro Leo Rizzo

Se alguns jogadores usam o trash talk para tiltar os adversários, o brasileiro Leo Rizzo prefere seguir por um caminho mais leve, mas não menos provocador: o da resenha, da zoeira e dos bordões marcantes.

Rizzo talvez não se encaixe na definição clássica de um “trash talker”, mas sua presença nas mesas é inconfundível e barulhenta. Ele é um verdadeiro personagem que transforma cada mão em um espetáculo, com bom humor, carisma e uma pitada de provocação.

O jogador é conhecido pelo público por algumas frases marcantes, como “tudo do oitavo! Pow, pow, pow”, entre outras. Durante o High Stakes Poker Brasil, ganhou uma mão pós all-in e provocou o campeão brasileiro de Omaha, Fernando Grow: “Você acha que os caras me chamaram aqui por que eu sei jogar poker? É pela resenha, irmão”, brincou

Além das palavras, Leo também brilha no teatro: já mandou beijo, piscou e sorriu para o adversário Damarjai Davenport durante a WSOP e, em outro evento, celebrou um blefe bem-sucedido como se fosse um gol: “Vamo, Brasil!”, gritando para seu adversário.

O mais interessante é que, por trás das piadas, Rizzo entende o impacto psicológico de suas ações. Ele cria um ambiente descontraído, mas nunca perde de vista a vantagem competitiva de colocar seus oponentes em situações desconfortáveis. Comemorar um blefe, jogar na cara do adversário e manter a resenha no alto volume faz parte da estratégia. Ele pode até dizer que está lá “pela resenha”, mas a verdade é que isso também faz parte do seu jogo.

Se Will Kassouf usa as palavras para desorientar, Martin Kabrhel para desgastar e Nik Airball para intimidar, Leo Rizzo usa a resenha para contagiar, confundir e, claro, ganhar potes. Um personagem que representa o Brasil nas mesas com muito mais do que fichas: com estilo, irreverência e uma língua solta, no melhor sentido possível.

E você, o que acha? O trash talk é realmente legal de assistir ou não tem espaço no poker porque aumenta a toxicidade da comunidade? Compartilha sua opinião nos comentários abaixo deste artigo.